domingo, 29 de março de 2015

Contar-te


Contar-te: tão grande que é, tão vasto o mundo... Tantas esquinas cruzadas, tantas avenidas largas e praças abertas ao mesmo sol, o mesmo cheiro a sal, no vento que me bate no rosto... Uma língua estranha, impossível de descodificar, rostos sem nome, iguais aos rostos que se reconhecem e se sabem nomear... Uma melodia antiga, um riso claro, um amor que brilha, duas mãos que se enlaçam sobre uma mesa igual a todas as mesas que existem em qualquer esplanada... E de repente, uma frase imortal riscada num muro, uma dor esquecida que se apodera de mim por dentro, que obriga o corpo a vergar-se debaixo do peso da memória... A alquimia da memória. De repente, é a memória que aperta as ruas, que estrangula as praças, que torna o mundo do tamanho da minha rua... A rua que percorro devagar, com o corpo dobrado para dentro do silêncio - sombreando as lembranças que nunca perdi -, é subitamente estreita e igual a todas as ruas por onde já andei... E carrego-te comigo, dentro dos meus olhos, levo-te a ver o mundo vasto, tão grande, tão pequeno afinal, porque uma frase imortal gravada nas ruínas de um muro, me tolhe os passos vencidos até ao fim da estrada, no mundo que conheço. 

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