Fecho suavemente a porta deste mês que termina... Janeiro é o mês em branco em que acreditamos que tudo é possível... Mas foi o mês que me arrancou as palavras, me silenciou e me roubou a luz. Janeiro atirou-me para dentro de mim, da minha solidão, foi em janeiro que baixei a guarda e pesei abandonar a escrita para sempre. Porque às vezes não temos forças... E sentimos medo... Muito medo. Mas isto da escrita é como um vício, uma dependência agridoce difícil de abandonar, as palavras assaltam-me de sopetão, montam-me uma cilada e sufocam-me até que as liberte das grades que existem algures, cá dentro... Elas ganham, e eu rendo-me sempre.
Em janeiro percebi que está tão longe o meu sonho azul de comprar um moinho, não um moinho qualquer, é aquele moinho velho que se ergue sobre as dunas claras à saída da curva apertada de uma solitária estrada de paralelos... De lá de cima vê-se o mar e ao entardecer o sol aninha-se meigamente para morrer nos céus incendiados... O mundo é um lugar mais belo visto das janelas do meu moinho de pedra...
Neste longo janeiro, rezei para que um cirurgião fosse guiado pela mão de Deus e pusesse novo o coração dentro do peito de uma pessoa que amo muito... Ela sobreviveu. Eu também. Só por isso, janeiro valeu a pena.
Faço as pazes com os dias... Impossível não ver a luz inesquecível que brilha no fundo deste janeiro que termina.